terça-feira, 18 de setembro de 2007

Joey Kramer


Quando fui estudar (pelo tempo recorde de 15 dias!) na prestigiosa Berklee College of Music, em Boston, lembro nitidamente de um painel com as fotos dos famosos ex-alunos da faculdade. A maioria das imagens era do pessoal de jazz, e alguns gatos pingados do R&B norte-americano. Do rock, apenas duas fotos: Muzz Skillings e Will Calhoun (ambos do Living Colour) e Joey Kramer (com um cabelo horroroso de mola de isqueiro).

Os dois primeiros eu até entendi, porque o Living Colour tinha uma pegada meio de virtuose, com muitas partes e tal. Agora, que diabos o baterista do Aerosmith poderia ter aprendido lá?
Até hoje não tenho resposta. Porque, com raríssimas exceções, os bateristas saem de Berklee com o mesmo “sotaque”, com uma pegada que não ajuda muito no universo rock’n’roll.

Vai ver a Berklee faz como o Colégio Objetivo: basta pedir informações na escola que você se torna automaticamente um ex-aluno. Não sei...
O fato é que isso deixou uma pulga atrás da minha orelha em relação ao Joey Kramer.

Quando o Aerosmith bombou de vez no Brasil, nos anos 90, comecei a prestar atenção nas baterias de JK. Mesmo naquelas baladas melosas, dava para perceber uma pegada firme e 100% dentro do ritmo. Fui atrás das coisas mais antigas do grupo, da época em que eles viviam on the edge (perdoem o trocadilho), e batida estava lá – sempre com pressão, sempre no lugar certo do compasso.

Joey Kramner consegue manter uma precisão acadêmica sem perder um milímetro de pura inspiração e influência rock’n’roll. Nas suas gravações, vc não encontra uma nota fora do tempo, nenhuma batida mais fraca que a outra, nenhuma sobra de prato ou de virada.
E como essa perfeição é tão incomum no universo musical, JK resolveu gravar algumas de suas batidas mais conhecidas, além de outras mais novas, e disponibilizou para venda o “Joey Kramer Drum Loops and Samples”.
Hoje, portanto, bastam U$ 50.00 para qualquer um ter JK no seu disco.

Para os que defendem a tese de que o Aerosmith não passa de um mistura lascada de Led Zeppelin com Rolling Stones (e essa idéia, em muitos momentos, até que procede), só peço que poupem o pequeno-grande Joey Kramer, porque ele, mesmo tendo um pouco de Charlie Watts e John Bonham, de lascado não tem nada :-)

Ah, dizem os livros que a idéia do nome da banda partiu de JK.

Vamos ao podcast, que hoje é dedicado aos irmãos Philippe e Alex Seabra, profundos conhecedores do melhor hard rock produzido nos anos 70 e 80.

Podcast: http://lomez.mypodcast.com/

SIGHT FOR SORE EYES
Draw The Line, 1977

“4 on the floor”. De novo, o termo aparece nesse blog. Aqui JK dá o gabarito da batida. Gosto do muito do som dessa bateria – aqui ele ainda não tinha optado pelos tons mais curtos. Legal também é a forma com que ele toca o ximbau. 100% de balanço.

LAST CHILD
Rocks, 1976

Para muita gente, o melhor disco do Aerosmith. Adoro o delay dessa bateria. JK amarra a música (no melhor sentido) e não deixa ninguém sair de perto do tempo. Das coisas que eu já ouvi do grupo, eu acho essa umas gravações mais bem feitas – as guitarras e as vozes são excelentes.

SWEET EMOTION
Toys In The Attic, 1975

Para mim, umas das melhores linhas de baixo de todos os tempos. A cozinha de JK e Tom Hamilton mostra porque é considerada uma das mais consistentes na história do rock. Outro detalhe importante que muitos se esquecem é que os dois reinam absolutos na categoria Seção Rítmica com o Cabelo mais Escroto, barrando todo o pessoal da Motown, todos os baixistas que passaram pela banda de James Brown (Bootsie, especialmente) e todos os bateristas brancos que encarnaram um permanente no fim dos anos 60.

NEVER LOVED A GIRL
Honkin' On Bobo, 2004
Versão moderna para o sucesso de Aretha Franklin. Escolhi essa por causa da forma com que JK toca o R&B. Ele mete a porrada, mas não esquece a essência de se tocar o blues em 3 tempos...

TOYS IN THE ATTIC
Toys In The Attic, 1975
Começa com o pé no acelerador e não pára mais. JK vai acentuando as passagens com a inflexão certa. Um dos clichês do rock é quando o baterista toca no prato de condução na hora do solo da guitarra, certo? Mesmo assim, são poucos que conseguem fazer essa transição sem derrubar a música. Ouça e veja como é que deve ser feita a passagem.

GIRL KEEPS COMING APART
Permanent Vacation, 1987

Uma versão mais moderna do que já foi o clássico R&B norte-americano. As guitarras (com exceção do solo) e a bateria tocam na melhor tradição Soul. Muito legal também é o arranjo de sopros.

MOTHER POPCORN
Live Bootleg, 1978
E por falar em tradição, nada melhor do que essa versão para o mega-sucesso de James Brown. Aqui, JK passeia por uma das batidas mais tradicionais e difíceis do cancioneiro Funky. Sem desmerecer os restante dos músicos (Joe Perry é mesmo um excelente guitarrista), a música funcionaria muito bem apenas com o sax convidado e com as baquetas de JK.

MAMA KIN
Aerosmith, 1973
Do 1º disco. Gosto dessa bateria pela qualidade técnica da execução e da gravação: podemos ouvir todas as nuances da batida. JK comanda muito bem as passagens e não faz corpo mole em acentuar TODAS as passagens da melodia. Normalmente, esse tipo de approach pode tornar a bateria busy (desculpem, não encontrei o português que se encaixasse melhor), mas JK toca no limite certo.

LOVE IN AN ELEVATOR
Pump, 1989
Apesar do clipe dessa música ser bem farofa, a bateria de JK é seriíssima e trabalha de uma forma que poderia causar ciúmes em John Bonham. Note como, nas estrofes, JK toca bem simples, de forma bem espaçada. Só quem tem o tempo muito acertado na cabeça, nos pés e nas mãos pode fazer isso sem atrasar ou atropelar a batida. Impressionante também é como ele muda o groove (não queria usar essa palavra, mas...) no bridge. Como diria o finado Carlos Imperial: “Bateria – 10, nota 10!”.

JIG IS UP
Rock In A Hard Place, 1982
Esse disco é bem renegado pelo fato de não contar com os dois guitarristas originais (Brad Whitford e Joe Perry). Mas JK toca, como sempre, muito bem. Essa música é um bom exemplo de como ele deixa o tempo assentar, mas sem nunca atrasar a batida.

WALK THIS WAY
Toys In The Attic, 1975
Clássico dos clássicos. Essa música está presente em todas as listas de grandes baterias do rock. Sua introdução poderia (e deveria) servir de teste para qualquer um queira se considerar baterista.


Era isso.
abs
Txotxa