segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

João Barone


Para entrar no clima desse fim de semana, vou falar do grande baterista João Barone. Fui ao show do Police no Rio, com abertura dos PDS, e achei o momento oportuno para falar do maior baterista de rock que temos (acho que é unânime, né?).

Antes, queria compartilhar a emoção de ver Stewart Copeland (juntamente com John Bonham, Tony Williams e Steve Gadd, um dos meus pilares baterísticos e musicais) ao vivo. Que classe!!!! É claro que algumas músicas, pela integridade física de SC e Andy Summers (Sting agüentaria fácil, fácil) foram executadas de 2ª marcha, sem aquela virilidade dos tempos áureos. Mas elas ganharam um balanço até então inédito para o Police. A idade, nesse caso, fez muito bem. E vê-lo tocando com a maior alegria (todos os 3, aliás), brincando e sendo sacaneado pelo Sting, deixando de propósito as baquetas caírem, tocando uma certa zona entre as músicas, dando uma aula na percussão – isso tudo não tem preço. Vibrei no show como não fazia há mais de 15 anos (quando ia, curiosamente, aos shows dos PDS): cantei junto, bati palma, acendi o celular (ridículo, eu sei), fiz mímica das passagens de bateria com a minha mulher (sabia todas de cor e salteado) e saí do show completamente extasiado. E as poucas músicas que tiveram o arranjo alterado (“Walking In Your Footsteps”, por exemplo), ficaram infinitamente superiores às originais.

Bom, este fim de semana inesquecível (foi a minha primeira visita ao Maracanã!) começou bem, com uma análise do Barone, encomendada pelo O Globo, sobre as semelhanças entre o seu estilo e o de SC. Fiquei feliz ao perceber de que algumas coisas que eu já havia escrito por aqui até que procediam...
http://oglobo.globo.com/blogs/jamari/post.asp?cod_Post=83111&a=39

Ao contrário do que escreveram muitos jornalistas brasileiros após o show, não existe base de comparação entre os dois, Na verdade, não dá para comparar SC com ninguém. Ele criou uma linguagem nova, que só ele sabe falar, só ele tem o dicionário. Começou e vai acabar com ele. É realmente uma divisão (ou um outro caminho) na forma de tocar bateria.

João Barone, apesar do estigma que o persegue desde o início da carreira, é um baterista bem diferente de SC e possui o seu próprio estilo. Acho que pela disposição da bateria e pela forma de segurar a baqueta ele tenha sido injustamente enquadrado como cópia de SC. Mas desde o 1º disco dos PDS, JB já mostrava que tinha personalidade e musicalidade de sobra para acompanhar os caminhos criativos de Herbert Vianna.

Como já escrevi bastante sobre esse assunto numa postagem antiga
http://txotxa.blogspot.com/2007/04/stewart-copeland.html, vamos direto seleção musical de hoje:

DOS RESTOS (0'10")
Big Bang, 1989
Esse é um disco dos Paralamas que, na minha opinião, merecia mais atenção das pessoas. Como “Perplexo” e “Lanterna dos Afogados” viraram hits, as outras músicas ficaram meio esquecidas (não nos shows, pois funcionavam muito bem ao vivo). Gosto muito da bateria de JB nesse disco inteiro. Como os PDS vinham de uma turnê intensa, tocando sempre, dá para sentir esse clima de banda foda em todas as faixas. Acho que se JB gravasse essa música hoje, ele a faria com um pouco mais de balanço entre as partes. Mas, de qualquer forma, essa batida funciona muito bem para a música. Gosto muito do final, com a percussão e a bateria dando as cartas.

MARUJO DUB (3'14")
Selvagem?, 1986

A dupla Sly & Robbie assumidamente foi, junto com o time do UB40, uma das maiores influências da cozinha Bi & Barone – acho que até a linha de baixo é copiada de uma música gravada por Robbie Shakespeare. Mas ao longo dos anos, os brasileiros foram ampliando consideravelmente o campo de ação e, eventualmente, deixando para trás os mandamentos jamaicanos do reggae. Mas aqui eles se encontram no auge dessa influência, que viria a se misturar com os ritmos brasileiros, transformando a cozinha dos PDS na base mais sólida do rock nacional. Adoro o som dessa bateria (principalmente das coisas eletrônicas). Essa gravação mostra o quanto Barone era (e ainda é) consistente com o andamento.

NAVEGAR IMPRECISO (6'00")
Severino, 1994
Esse disco foi um dos maiores que o rock nacional já produziu, mesmo que gravado na Inglaterra (pelo menos 80% dele), com produtor gringo e tudo mais. A riqueza de arranjos, de sons, de conceitos e de participações nunca aconteceu de novo por aqui. Só fiquei triste ao ouvir o Herbert Vianna dizendo que, por causa da baixa vendagem do disco (apesar de “Cagaço” e “Dos Margaritas” terem tocado nas rádios), eles não iriam mais produzir discos para “ficar na estante dos parentes e dos amigos”. De qualquer forma, esse disco é muito foda. E essa música, com as vozes de Tom Zé e Linton Kwesi Johnson, é incrivelmente bem produzida e arranjada. Barone amarra a música e carrega com muita propriedade uma batida meio complicada, com um ximbau incrivelmente preciso..

O PASSO DO LUI (9'15")
O Passo do Lui, 1984
Até hoje gosto muito dessa música. Não cheguei a assistir a um show deles que ela estivesse no set list, mas queria ter ouvido uma versão ao vivo, mais vitaminada. Essa gravação (aliás, esse disco) mostra o Barone muito ligado nas coisas do Stewart Copeland. Mas independente disso a bateria dele é fodassa. Uma introdução como a de “Óculos” (independente da inspiração) é sempre digna de nota. E nessa gravação que dá nome ao disco, ele passeia pelas diversas partes do arranjo com muita firmeza e precisão.

O HOMEM (11'32")
D, 1987
Skank e Rappa passaram longos anos tentando imitar isso e nunca chegaram perto. Sem querer dar uma de vibrão, eu diria que essa gravação (e a música, também) é um das melhores dos PDS. Aliás, o disco é impressionante (o melhor ao vivo que eles já lançaram e, talvez, o melhor do rock brasileiro), sem falhas, com pegada e vigor de sobra. Barone dá um show, tocando nas peças eletrônicas sem perder um centímetro da categoria. Eu considero a 1ª parte do dubwise (baixo, bateria e o pandeiro do tecladista João Fera), nos 14'06" do podcast, um dos melhores momentos dos PDS.

POR SEMPRE ANDAR (15'51")
Hey Na Na, 1998
Isso é introdução para derrubar qualquer um da cadeira. A batida é sensacional (e que percussão!). Um dos poucos momentos em que o pedal duplo de JB serve bem ao arranjo. Esse disco me deu uma alegria muito grande, pois parecia indicar um caminho para os próximos discos de estúdio dos PDS: alguns hits mais alegres e outras músicas mais experimentais, com mais personalidade. Infelizmente, o trágico acidente com HV acabou com qualquer expectativa que se poderia ter a respeito do grupo. De qualquer forma, esse disco é excelente. E essa música tem uma das melhores partes de guitarra que HV já gravou.

O ROUXINOL E A ROSA (19'07")
Os Grãos, 1991

E por falar em superlativos, taí o melhor disco dos PDS. De todos que eles já gravaram, se eu tivesse que escolher um para a posteridade, escolheria esse. Aqui os PDS dão uma aula de composição, de arranjo e de produção (com o parceiro Savalla). Escolhi essa música pq tem uma pegada diferente, com um clima de Rolling Stones. Barone sempre se sai muito bem nesses andamentos, meio-tempo de rock clássico, e mostra que entende tanto de reggae quanto de rock. E o baixo de Bi Ribeiro é um dos mais fodas que já ouvi nos discos dos PDS.

BUNDALELÊ (22'51")
Bora-Bora, 1988

É certo que não podemos viver apenas no campo emocional. Eu sei que temos que colocar a cabeça para funcionar de vez em quando no esquema duro da realidade. Mas quando o assunto é “disco com o maior número de lembranças da sua vida” o Bora-Bora é um dos campeões. Eu era muito fã dos PDS nessa época. Sabia tudo de cor, ia a todos os shows, tocava (com minha primeira banda) a maioria das músicas do lado “A” desse disco. E a lembrança dessa música é ainda mais especial. Como se fosse hoje, me recordo do dia em que a tocamos pela 1ª vez. A sensação dessa bateria, com os sopros, com essa guitarra (mesmo que tocada por um bando de moleques) ainda me arrepia. Uma coisa engraçada sobre esse disco era a quantidade de discussões que tínhamos na escola sobre como tocar as baterias corretamente. Quem soubesse fazer igualzinho, por exemplo, a bateria de “Uns Dias”, ganhava imediatamente o título de “melhor baterista da escola”.

CAPITÃO DE INDÚSTRIA (25'14")
9 Luas, 1996
Clássico JB. Ele passeia pela música, dando o balanço certo, na hora certa. Esse disco, aliás, tem umas baterias maneiríssimas (e umas músicas meio suspeitas). Mas ao vivo, nos shows dessa época, eu acho que JB acabou se tornando uma cópia de si mesmo. E se não me engano, nessa época (ou um pouco antes), ele começou a usar o pedal duplo de uma forma meio lascada, pouco musical. Mas aqui ele toca o “feijão com arroz” que, em termos de cadência e pressão, o diferencia de 99,9% dos bateristas brasileiros.

SÁBADO (28'40")
Os Grãos, 1991
A melhor gravação do melhor disco do PDS. Nunca ouvi o grupo tocar com tanto balanço, com o som tão amarrado, com tanto estilo. Sei que rola uma base eletrônica pesada, mas acho que a bateria toca junto, por cima de tudo, em muitos momentos. Tamanha é a cadência de Barone, fica até difícil fazer essa diferenciação. Posso estar falando besteira, não sei... De repente não tem bateria nenhuma... De qualquer forma, a menção fica registrada (até mesmo pq ele toca dessa mesma forma ao vivo. Com um pouco menos de bumbo, mas com o mesmo balanço). Detalhe para o sample de “Good Times, Bad Times”, do Led Zeppelin, no bridge antes do solo de guitarra.

IMPRESSÃO (32'29")
Bora-Bora, 1988

Lado B sensacional do disco. A pressão dessa batida é impressionante. Se eu tivesse que escolher uma música que representasse a bateia JB, escolheria essa. Tem tudo: cadência impecável, dinâmica de sobra, escolha de timbres e peças, pegada e balanço de sobra. Curto também o arranjo, com citação dos Beatles, com a voz do HV lá no fundo e com o baixo amarrando tudo.

Podcast: http://lomez.mypodcast.com/


Era isso.
abs
Txotxa