terça-feira, 10 de março de 2009

Joe Morello


Mantendo o meu ritmo acelerado e constante de atualizações, vou escrever hoje sobre o grande Joe Morello. Para quem não ligou o nome à pessoa, ele foi, por mais de duas décadas, membro de um dos maiores e mais famosos grupos de jazz de todos os tempos: o The Dave Brubeck Quartet.

Com esse grupo, JM viajou o mundo inteiro (eles eram, REALMENTE, muito famosos) e ajudou a divulgar o jazz em lugares, até então, meio desligados desse estilo musical.

Assim como a maioria de seus colegas, JM descobriu a bateria pelos caminhos da música erudita. Ele aprendeu sobre tímpanos, sinos, pandeiros, pratos e tudo mais. Mas numa época onde as big bands comandavam, Morello se viu rapidamente sentado atrás de um kit tocando jazz.

Hoje, do alto dos seus 80 e poucos anos, é o que ele ainda faz. Na verdade, se especializou também na arte e ensinar. Escreveu dois livros fundamentais sobre técnicas baterísticas e dá aulas para um seleto grupo de alunos sortudos.

A partir da seleção abaixo, vou tentar explicar o que faz com que JM seja considerado um dos maiores bateristas de jazz de todos os tempos. E para mostrar o quanto isso procede, li certa vez que Buddy Rich, quando estava nas últimas, adoecendo num quarto de hospital, disse para sua esposa: “Diga ao Joe que não pare nunca de tocar. Ele é um dos poucos que entendem do assunto”. Quer credencial melhor do que essa?

Ah, para facilitar a vida de todos (especialmente a minha), só escolhi músicas dos anos de Morello com Dave Brubeck, na formação clássica do quarteto, que contava ainda com baixo seguro de Eugene Wright e com o sax mais lírico do jazz, Paul Desmond.

Vamos às músicas:

Podcast: http://podcast1.com.br/canal.php?codigo_canal=705
(tive que mudar de novo o servidor...)

WATUSI DRUMS
Time In, 1966
É impressionante a qualidade técnica de JM nessa música. Repare como a mão esquerda toca a caixa o tempo inteiro (e ainda dá uma dinâmica fenomenal). Tão difícil quanto tocar essa batida é imaginar a falta que ela faria nesse blues. Aliás, sem querer desmerecer a genialidade de Paul Desmond, mas eu adoro quando o quarteto vira trio e podemos ouvir o quanto Dave Brubeck e Eugene Wright sabiam swingar.

COUNTDOWN
Countdown: Time in Outer Space, 1962
Aqui Joe Morello toca também os tímpanos – coisa que ele aprendeu desde cedo, numa formação erudita de 1a. De novo, o quarteto funcionando muitíssimo bem como trio. Dave Brubeck toca um piano boogie-woogie digno da realeza de New Orleans. Como o nome do disco já diz, o tempo aqui foi para o espaço. Pelo menos no que diz respeito à tradição do jazz, acostumada aos compassos de 2, 3 e 4 tempos. Mas o TDBQ faz esse tempo de 5 (pelo menos eu acho que é isso) soar agradavelmente redondo.


CHARLES MATTHEW HALLELUJAH
Time Further Out, 1961
Essa foi escrita para celebrar o nascimento de um dos filhos de Brubeck. Sempre gostei dessa música pela forma como o sax alto e o piano vão se revezando no esquema de pergunta e resposta da melodia. E as vassourinhas de Joe Morello parecem que vão levantar vôo, tamanha é a velocidade desse andamento (*). O solo que ele faz é de muito bom gosto, além de muito técnico. Aliás, um dos diferenciais de JM para os outros grandes que tocavam em sua época (Buddy Rich, por exemplo) é que ele tocou com o mesmo grupo, com as mesmas pessoas, nesse formato de quarteto, durante muito tempo. Querendo ou não, ele acabou adaptando a sua tremenda técnica aos limites do conjunto. Diferente do que fazem boa parte dos bateristas de jazz, que “precisam” mostrar o quanto são fodas o tempo inteiro, JM toca 100% como parte do time. E nesse ponto, ele se aproxima muito dos (bons) bateristas de rock, que pensam a sua bateria nunca em termos técnicos, mas sim como parte do todo.

(*) Ah, por falar em andamento rápido, queria indicar esse vídeo do sensacional Bill Cosby. Vale muito a pena... principalmente, a partir do 1o. minuto.
Bill Cosby @ Dick Cavett


IT'S A RAGGY WALTZ (Live)

The Dave Brubeck Quartet at Carnegie Hall, 1963
Resolvi arriscar e colocar uma música de 7’. Preferi essa versão a de estúdio pq mostra o quanto esse quarteto sabia improvisar. Uma das críticas que o grupo recebia de muita gente (muita gente boa, inclusive) era que tocavam muito dentro dos limites do tema, sem muito espaço para o improviso (que é a razão de ser do jazz). Mas essa música (e esse disco) mostra que a crítica se dava mais, talvez, pelo sucesso que faziam do que propriamente por suas habilidades criativas. Quer ver, repare como DB, no meio de seu solo, empurra a batida para um swing clássico, enquanto os outros permanecem firmes do 3/4, lá pelo 12’26” do podcast.


KATHY'S WALTZ
Time Out, 1959
Clássico. Tava lendo algumas coisas aqui e descobri que esse disco (que tem o mega hit “Take Five”, com um solo de bateria tão conhecido quanto “Moby Dick”) chegou ao Top 5 da Billboard quando foi lançado. Que coisa, não? É impressionante o quanto esse disco, ainda hoje, agrada qualquer um de primeira. Mesmo que o freguês não entenda nada de jazz, acaba se interessando muito pelo som. Cá para nós, foi exatamente o que aconteceu comigo :)). Bom, sobre essa música, é interessante notar que ela começa com um swing e logo cai para o tempo de valsa (quando entra o sopro). Até aí, tudo bem. O grande barato é quando o solo de piano já está lá pelo meio e Dave Brubeck começa a mudar o pulso, tocando um clima de swing, enquanto a bateria fica na valsa e o baixo se mantém firme na batida.


SHORT'NIN' BREAD
Gone With The Wind, 1959
Pensei muito antes de colocar essa música porque, mesmo sendo curta, é praticamente um solo de bateria (o que, a princípio vai contra as regras desse blog). Mas acho que ela ajuda a mostrar o quanto Joe Morello era musical e cheio de swing. Experimente bater palma ou o pé junto com o ximbau. Quando menos esperar, vai estar dançando...


HE DONE HER WRONG
Time In, 1966
E por falar em dançar, isso é o mais próximo que um compasso de 5 tempos chegou de um agito festivo (pelo menos em terras ocidentais). Gosto muito do esquema do pandeiro por cima da caixa (eu acho que é assim que ele toca). Um balanço de primeira qualidade!!!


MAORI BLUES
Time Further Out, 1961
Rapaz, como eu ouvi esse disco... Tenho ele em vinil, em cd e em cassete. Tem uma capa maneiríssima – uma pintura de Joan Miró. Aliás, o subtítulo do álbum é “Reflections on Miró”, já que o quadro em questão é cheio de números espalhados, e Dave Brubeck resolveu montar as músicas nos compassos referentes a cada um desses números. Essa música mostra bem as diferenças de clima entre o swing e o blues. Repare como ela começa mais carregada e, aos poucos, o piano vai se soltando e “correndo”para um pulso mais jazz. A bateria acompanha, mas o baixo fica como está, e isso cria uma tensão bem bacana.
Olha a capa aqui:




SOBRE LAS OLAS
Bravo! Brubeck!, 1967
Essa gravação foi feita ao vivo no México, junto com uns músicos mexicanos. É interessante notar o quanto Joe Morello, sendo um brancão de Boston, interage bem com os bongos latinos. Tendo a acreditar que não existe barreira cultural quando falamos de grande músicos, e aqui isso bem claro, não? Muito legal também a forma com que JM, na hora do tema tocado pelo violão, abre e fecha suavemente seu ximbau. Classe de sobra...


CAMPTOWN RACES
Gone With The Wind, 1959
A 1a. vez que ouvi essa música foi no filme mega-indie-clássico instantâneo “Consciência Limpa”, do meu grande amigo Jr. Elcio, lá por volta de 1991. É impressionante o poder que a música certa num filme exerce sobre nós. E esse é um dos casos, certamente. Depois, quando fui prestar mais atenção nessa gravação, fiquei de cara como essa bateria é de outro mundo. Repare que JM, quando está nas vassourinhas, está tocando o bumbo como se fosse um surdo, cheio de inflexões difíceis até para as mãos (o que dizer para os pés!!). Uma aula de orquestração e bom gosto para deixar qualquer um de queixo caído.


UNSQUARE DANCE
Time Further Out, 1961
Essa nem tem tanta bateria assim, mas acho legal o clima das palmas e o desafio de tocá-las no tempo :)) E dou 2 reais para quem conseguir explicar o final.


BLUE RONDO A LA TURK
Time Out, 1959
Como escrevi a algumas músicas atrás, esse disco me impressionou numa época em que eu não sabia (nem queria saber) nada de jazz. Estava no 2o. grau e minhas preocupações musicais eram outras. No entanto, quando peguei esse disco emprestado com o amigo Espiga (um dos fundadores do grupo TUBA ANTIATÔMICA), junto com o "Blues on Bach"(Modern Jazz Quartet), fiquei de cara. Mesmo sem entender tudo que estava lá, sabia que era um som do caralho. E essa música, a 1a. do disco, é muito impactante. Até hoje considero essa introdução uma das coisas mais maneiras já feitas por um grupo. Repare como a bateria vai entrando aos poucos, como o sax ora reforça a linha melódica do piano e ora expande essa melodia.
Nota 10!


Era isso.
abs
Txotxa