quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Larry Mullen Jr.


Larry Mullen Jr é um cara que há muito tempo admiro. Seja por sua conduta low profile na maior banda de rock das últimas décadas, seja por seu estilo atrás da bateria, LM sempre teve a minha torcida. Ele toca simples, mas com uma pressão e precisão que não estamos acostumados a ouvir. Daniel Lanois, um dos sócios-produtores do grupo, foi quem melhor resumiu a arte de Larry Mullen com as baquetas: “He always delivers”. Não importa a situação, o arranjo, o dia, LM facilita a vida de qualquer produtor e engenheiro de som, pois toca com a firmeza de quem sabe exatamente o que quer. E isso, por mais elementar que possa parecer, não é nada simples. É comum vermos um músico querendo tocar além do que sabe e se atrapalhar numa gravação, num ensaio ou num show. Por isso, ter a exata noção de suas capacidades é tão importante quanto ter de fato essas capacidades. E Larry Mullen sabe disso.

Desde o primeiro disco do grupo, ficou claro que LM não era um baterista comum. Nem tanto por sua técnica (que era similar a da maioria dos bateristas do pós-punk), mas por sua decisão na hora de tocar. A impressão que me passa ao ouvir as suas baterias (das antigas às mais recentes) é que está tudo escrito em algum lugar. John Bonham é um cara que passa essa impressão, mas podemos sempre ouvir algum improviso seu (principalmente ao vivo). Já LM, no momento em que define a batida em sua cabeça, segue inabalável, sem dúvidas quanto à qualidade do que está fazendo. Numa analogia futebolística, isso corresponderia a um jogador que bate sempre bem na bola, sempre na direção certa, sempre com objetividade, sempre jogando em prol do time. E isso, na minha opinião, é a principal e a primeira função de qualquer baterista: jogar para o time. Isso implica em criar uma certa batida, num certo andamento, com uma certa inflexão, que faça com que os músicos ao seu redor toquem mais fácil, toquem melhor. E Larry Mullen faz isso.

No campo menos musical, curto o seu visual clássico bonitão. Desde que resolveu arrepiar os cabelos curtos, nunca mais mudou. Seus colegas já tiveram milhões de disfarces ao longo dos anos, mas LM mantém-se fiel ao seu buzz cut. Além disso, ele é o único cara no mundo que, quando necessário, tem a moral de puxar a orelha do vocalista Bono. Há pouco tempo, quando Bono, por conta de suas atividades extra-musicais, começou a faltar com o U2, foi Larry quem o chamou na regulagem.

Bom, além de tudo isso, Larry Mullen Jr bolou a introdução de bateria mais tocada em todos os tempos (pelo menos nos meus anos 80): “Sunday Bloody Sunday”. Sério, quando esse disco bombou aqui no Brasil, 10 entre 10 bateristas tocavam (ou tentavam tocar) essa batida. Quem soubesse tocá-la se diferenciava instantaneamente do resto da gentalha. E vou te falar uma coisa: nesses 24 anos desde que a música surgiu, nunca ouvi ninguém tocar da mesma forma que Larry Mullen Jr. Mesmo com apenas 20 anos, ele sabia muito bem o que estava fazendo.

Vamos à seleção musical...
http://canal.podcast1.com.br/lomez

OUT OF CONTROL
Boy, 1980
Gosto muito dessa melodia. Dá para ouvir a voz do Bono ainda se acertando, mas a banda já tinha a pegada firme. Acho muito legal o fato de Larry Mullen tocar o bumbo em todos os tempos do compasso. Dá um balanço sensacional, empurrando a música o tempo inteiro. E o arranjo é bem legal também. Poucas vezes o U2 produziu uma música tão direta e empolgante assim.

''40''
War, 1983
Apesar de “Sunday Bloody Sunday” ter sido eleita “a bateria” desse disco, “40” é muito mais complicada. Aliás, toda batida nesse andamento é complicada, pq o baterista (e a banda) tende a atrasar. Além disso, o clima dela é bem de R&B, o que dificulta ainda mais – além da pegada firme, o cara ainda tem que dar o balanço. No finzinho, antes do fade out, LM faz uma variação na caixa que parece meio errada. Não sei... Só sei que se foi erro, ele fez muito bem em não parar o take – uma performance dessas não se repete assim tão facilmente. Me admira que essa batida não tenha ainda sido sampleada.

MYSTERIOUS WAYS
Achtung Baby, 1991
Quando esse disco saiu, a imprensa louvou a mudança de rumo do U2. Muito se falou dos arranjos, dos conceitos, dos timbres, das letras, mas quase ninguém falou da bateria. No documentário do disco, Larry Mullen aparece dizendo: “a melhor coisa do disco é a bateria”. Não sei se a melhor, mas foi ela que tornou possível essa guinada musical do U2. Se ouvirmos os discos anteriores do grupo, não vamos encontrar nada nas batidas que aponte para a revolução de “Achtung Baby”. LM toca nesse disco (e nessa música) com um balanço fenomenal, cheio de swing, mas com a pegada fortíssima de quem veio do rock. E tocar um ritmo desses sem encher a batida de notas é mesmo para poucos.

ENDLESS DEEP
Single, 1983
Logo que comecei a tocar com a Plebe, o André me emprestou um bando de discos sensacionais. Dentre eles, estava o 1º do Comsat Angels. Quando ouvi, achei algumas coisas muito parecidas com o U2. Depois fiquei sabendo que eles (U2) abriram uma das turnês do grupo – o que talvez explique a paixão (copiada?) do The Edge pelos harmônicos na guitarra. Essa música me lembra vagamente o Comsat Angels. Mas o que eu gosto mesmo é a forma como Larry Mullen e Adam Clayton funcionam juntos nessa gravação. Desde cedo os dois já mostravam talento para tocarem juntos.

IN GOD'S COUNTRY
The Joshua Tree, 1987

U2 clássico. Gosto muito do arranjo dessa música. É uma coisa simples, mas note como o baixo para de tocar todo fim do compasso, criando o espaço para a virada da bateria. Acho legal também o fato de Larry Mullen usar, nessa música, o surdo no lado esquerdo – dá um clima diferente para a execução. Uma curiosidade sobre essa época é que LM não usava prato de condução, tamanho era o seu comprometimento com o cerne da batida.

THE REFUGEE
War, 1983
Aqui LM dá show, usando tambores, timbales, cowbells e tudo mais. Linha de baixo muito bacana, também. E guitarra nota 10! Eu era muito moleque para acompanhar as críticas mais adultas sobre esse disco, mas a qualidade de LM nesse disco é digna de nota. Talvez por dividir os holofotes com The Edge (que é um dos maiores guitarristas do séc. XX), Larry Mullen tenha sido sempre meio desprezado.

THE ELECTRIC CO.
Boy, 1980

Uma das melhores músicas do U2. Vi que eles voltaram a tocá-la nessa última turnê. Sensacional. É uma aula de vitalidade na bateria. Note como LM toca o tempo inteiro, mudando as batidas, numa música cheia de partes, com várias dinâmicas. A guitarra do The Edge é também uma das melhores. E Adam Clayton nunca mais chegou perto desse gás nas 4 cordas. E quem se importa com o andamento dando uma corridinha do meio para o final? Sem trocadilhos, uma das performances mais eletrizantes do grupo.

BEAUTIFUL DAY
All That You Can't Leave Behind, 2000
Essa tocou muito. O grande barato é ouvir como LM tira de letra um troço que é o pesadelo de qualquer baterista de rock: tocar em cima de uma base gravada. E ele faz isso ao vivo do mesmo jeito, sem suar. Esse disco mostra como a relação músico-produtor é uma coisa importante. Independente do gosto, todos os discos do U2 que foram produzidos por Daniel Lanois têm baterias sensacionais. E isso vem da admiração incondicional que DL tem por LM. No documentário do “Joshua Tree”, tem uma cena em que Larry Mullen grava a bateria e Daniel Lanois aparece vibrando, batendo cabeça atrás do vidro da técnica.

LIKE A SONG...
War, 1983
Essa é pelo som de bateria, quase industrial. Uma coisa que não se ouve mais é o baterista variar a batida o ximbau (dobrando as notas) no meio da música. Não sei se é pq se tornou uma coisa uma coisa muito batida nos anos 80 – cara dobrava no refrão e diminuía na estrofe (ou vice-versa). Aqui LM faz isso com categoria, sem perder a pegada. Gosto muito da levada dos tambores, também.

BAD
The Unforgettable Fire, 1984

Aqui, Larry Mullen dá uma aula no quesito dinâmica e orquestração dos seus tambores. Note como a bateria vai crescendo junto com a música. E não é só no volume – ele muda as partes da bateria para acompanhar o arranjo. Não tem nada de revolucionário, eu sei, mas é de um bom gosto fora do comum. Essa música ficou meio desgastada, com um jeitão de hino, mas mostra o quanto o U2 era uma banda musicalmente superior. Afinal, são dois acordes (acho que é isso, né?) tocados ao longo de 6’, sem nenhuma gordura no arranjo. E que baixo, hein?

Era isso.
abs
Txotxa

7 comentários:

Ana Laura disse...

Finalmente um nome que eu conheço...hehehe.
beijo.

F3rnando disse...

Incrivelmente eu passei incólume ao U2 nos anos 80. Toda aquela imagem mesiânica da banda me mantêve afastado deles, até o 'Achtung Baby', que eu acho um discaço! O juninho aí se garantiu de não perder espaço (e emprego) pra drum-machine, tivesse ele um ego um pouquinho mais instável, ia ver a confusão... E aí, Txotxa, curtiu a foto do Lars? Abração!

Txotxa disse...

Ana Laura,
Pode deixar que eu vou colocar uns carinhas mais conhecidos :)

F3rnando,
Não consegui abrir a imagem do Lars.

F3rnando disse...

Ah, de outra vez te mando então :)

Anônimo disse...

Txotxa, querido, também sou fã do Larry.

Há um tempo dou umas olhadas no seu blog, mas o que me motivou a falar agora foi a postagem sobre Charlie Watts... Porque eu fico emocionado toda vez que leio/ouço elogios de reconhecimento a este mestre (sou fã de Stones, e o Charlie pra mim é um Deus).
Você falou em "LET ME GO", e observo aqui que nas versões ao vivo ele dava o "ride" da música com batidas na caixa (em vez da combinação de guizo e chimbal da gravação de estúdio), o que acho muito mais legal.
Se eu fosse escrever sobre ele, acho que recomendaria o Exile (faixas tocadas por ele - quase todas) e o "SOME GIRLS" inteiros... neste último, a bateria é timbrada de maneira que podemos sentir a "respiração" da batida semi-jazzística do cara (acho que você entende o que quero dizer).

Mais uma coisa: R.I.P. Max Roach.
Não li ainda o seu texto sobre ele, mas eu certamente mencionaria uma das loucuras do homem: aquela música com o solo de hi-hat.

Abração!

Unknown disse...

McLovin!!kkkkkkk esse filme é muuuuito bom!! Ri longamente só de lembrar!!!

Txotxa disse...

grande jorginho,

que legal a sua presença, rapaz. vale ouro!! assino embaixo de tudo o que vc escreveu (apesar de gostar do guizo em "Let Me Go" :)).

abração para vc



Fabicatarse,

McLovin' é bom demais, né?