quarta-feira, 30 de maio de 2007

Roger Taylor


Confesso que nunca fui muito ligado nessas coisas de destino, de sinais. Não vou entrar aqui no mérito da questão, mas todo assunto mais sobrenatural dificilmente ocupa a minha cabeça. Mas algumas situações, quando a gente olha por essa lente mais esotérica (vamos chamá-la assim), fazem um sentido danado.

Tenho um exemplo desses momentos: quando estava conhecendo melhor a Geórgia (minha mulher, ou esposa, se preferir), entre mil conversas, ela falou duas coisas que me deram um estalo e me fizeram acreditar num belo futuro entre nós. Uma delas foi citar uma das piadas do filme Wayne’s World (até o momento, não conhecia nenhuma mulher que fosse ligada naquele tipo de piada). A outra foi dizer que gostava muito da bateria do Roger Taylor. Tudo bem que ela gostava também do John Taylor, excelente baixista gatão do Duran Duran, mas elogiar o RT não era algo que eu estava acostumado a ouvir. Muito menos era uma daquelas coisas que a pessoa fala para querer agradar o quase-namorado baterista. Era sincero.

Bom, como deu para perceber, o homenageado do dia é Roger Taylor, o baterista de uma das maiores bandas de todos os tempos, o Queen.

Uma coisa que sempre me chamou a atenção na bateria de RT é o quanto ela joga para o time. Ele entendia muito bem do riscado, mas estava sempre ligado na música, nos outros instrumentos e na voz. Sempre. E apesar de tocar numa bateria gigantesca, as suas batidas poderiam ser reproduzidas em qualquer kit de 4 peças. Isso mostra o quanto ele compreendia a estrutura do ritmo, coisa da escola do rock’n’roll clássico, que privilegia tanto o rock quanto o roll – mesmo nas músicas mais retas do Queen, podemos ouvir sempre um balanço.

Outra característica de RT, principalmente nos shows, era a forma como se entregava ao momento. Quando vejo algumas de suas apresentações, fico achando que ele vai morrer no meio de uma passagem, tamanha é a energia que ele carrega nas baquetas. Mas ele sempre dá um jeito de chegar e resolver a música. E o homem nunca economiza nas batidas, deixando o melhor para o final (como fazem muitos bateristas). Com RT, o show já começa a mil por hora. Talvez por isso (e claro, Freddie Mercury) o Queen tenha tido, por anos, o melhor show do planeta.

Além de suas qualidades como baterista, RT ainda cantava para burro. Tinha uma voz meio fanha e rasgada, mas conseguia chegar nas notas mais altas e cuidava de todos os backing vocals do Queen. E cantar (e tocar) junto com Freddie Mercury não é mesmo para qualquer um.

Vamos ao podcast


COMING SOON
(The Game, 1980)
Como deve ser uma levada de música nos toms? Aqui está o gabarito. Já ouvi RT elogiando horrores o som de bateria desse disco. Realmente, a produção desse disco é fabulosa – criou um referencial para todos os discos do Queen. Grande música de um disco melhor ainda.

MUSTAPHA
(Jazz, 1978)
Não mexa no volume – essa mixagem é muito doida de propósito. RT mostra o quanto sabia estruturar as partes de sua bateria de acordo com a música. Note que para cada momento ele usa uma célula específica. Uma coisa que ele sempre fez com maestria foi prender o prato logo após a batida, pontuando os acentos. Aqui ela dá uma aula de como isso deve ser feito.

GET DOWN, MAKE LOVE
(News Of The World, 1977)
Qualquer música em que a bateria não toque o tempo inteiro é sempre muito difícil para o baterista. Quando a bateria pára, e o ritmo continua, a concentração tem que ser dobrada. E essa música é bem o caso. Mas RT toca com perfeição. E a escolha das peças que ele usa nos ataques é de altíssimo nível. Aqui o Queen mostra o talento fabuloso de seus músicos.

UNDER PRESSURE
(Hot Space, 1982)
Uma das características de RT e sempre acentuar o ximbau junto com a batida da caixa (o oposto do que fazia Charlie Watts). Isso dificulta muito tocar as músicas do Queen, pq tem um som a mais que não é nada fácil de reproduzir. Escolhi essa música pela cadência sensacional que possui e pela levada no prato de ataque (outra de suas características), no minuto 12’03” do podcast. David Bowie nunca cantou numa base tão sólida.

DRAGON ATTACK
(The Game, 1980)
Show de bola. Quem me chamou a atenção para essa música foi o meu amigo Marcello Capa, dos Resistores. A batida já é difícil (o ximbau toca todas as notas sem parar), mas RT ainda tira uma onda e acrescenta uns overdubs de bateria, aos 14'57" do podcast. Um ótimo exemplo do poder da cozinha Deacon/Taylor.

GOOD OLD FASHIONED LOVER BOY
(A Day At The Races, 1976)
Uma música meio gay (no sentido Cole Porter do termo) em que a bateria (junto com o piano) dá todo o balanço, além de acompanhar todas as nuances do arranjo. De novo, RT mostra todo o controle que tem da bateria. E o solo de guitarra? Não sou guitarrista, mas considero o Brian May um dos maiores talentos do instrumento. Basta uma nota para que seu som seja imediatamente reconhecido. E curto também o fato de ele ter usado, durante muito anos (quando já existia o sistema sem fio), aquele cabo de guitarra igual ao de telefone.

THE LOSER IN THE END
(Queen II, 1974)
O delay da bateria e sensacional. Talvez a batida inicial e as frases finais sejam as coisas mais técnicas que RT tenha tocado. É pq é uma coisa meio de jazz, com uma sutileza diferente do rock’n’roll, com umas coisas mais sofisticadas . Esse é um bom exemplo de como ele, mesmo com um repertório imenso, jogava para o time e para a música. Ah, ele é o cantor dessa!

DON'T STOP ME NOW
(Jazz, 1978)
A Geórgia (aquela dos parágrafos iniciais) me obrigou a colocar essa música. Mas como não sou pau-mandado (até parece...), escolhi a peça por motivos exclusivamente baterísticos. A energia de RT é impressionante – note como o bumbo toca todas as notas do compasso, no melhor estilo punk rock (26'20" do podcast). Além disso, o coro é sensacional.

SHEER HEART ATTACK
(News Of The World, 1977)
E por falar em energia punk rock, essa é um ótimo exemplo de como o Queen podia soar pesado sem parecer caricato. E isso em 1977. A bateria é bem retona, mas ainda mantém aquele balanço. Gosto muito das marcações que a bateria faz nessa parte (28'51" no podcast). Em uma música com essa velocidade, qualquer derrapada da bateria pode estragar todo o conjunto. Na dúvida, a maioria dos bateristas segue adiante, sem complicação (e inspiração), mas RT chama a responsabilidade e segura as rédeas de uma das músicas mais porradas do grupo.

YOU'RE MY BEST FRIEND
(A Night At The Opera, 1975)

De novo, a dificuldade de se tocar decentemente um shuffle. Gosto da forma com que RT toca essa batida, respirando junto com a música. É um dos maiores hits do grupo, composto pelo baixista. Aliás, o baixo de JD (e eu acho que ele tocou o Fender Rhodes, também) faz toda a diferença.

BRING BACK THAT LEROY BROWN
(Sheer Heart Attack, 1974)
Gosto desse esquema do Queen com músicas e arranjos meio de jazz/cabaré. A parte da bateria é tão precisa que parece ter sido escrita, com todos os acentos bem marcadinhos. Ao longo dos anos eles acertaram ainda mais a fórmula (A Night At The Opera e A Day At The Races), mas eu curto bem essa versão, com banjo, baixo acústico e tudo mais que pede o estilo.

FAT BOTTOMED GIRLS
(Jazz, 1978)
Hit presente em qualquer coletânea do grupo. Gosto muito da forma com que a bateria e o baixo vão segurando a estrofe, para descer a mão na hora do refrão. A virada de RT, aos 39'04" do podcast, é tão simples quanto eficaz. Eu nunca fui muito fã desse som de tambor, mas, para essa virada, a escolha de som foi perfeita.


É isso aí.
abs
Txotxa

9 comentários:

Anônimo disse...

Alô Txotxa!
Grande lembrança falar do Roger Taylor! Aproveito para registrar minha admiração incondicional pelo estilo do Brian May, outra lembrança mais do que oportuna! Aquele abraço do Sylvio!!

F3rnando disse...

Txotxa, é admiravel não só o tom altamente didático dos seus posts, aliado ao ecletismo dos bateristas (em relação aos estilos), mas realmente vc se supera em cavucar material, já tinha notado isso quando do Alex Van Halen por aqui e vc escolheu coisas de discos "obscuros" como 'Fair Warning'. Hoje de novo vc se superou: eu acho Queen uma banda legal mas não teria o mínimo saco de ouvir nada de discos como 'The Game' ou 'Jazz'. Dessa fase dos caras se salva a trilha do Flash Gordon, e olhe lá. Parabéns mesmo por vc "pescar" essas raridades. Abração.

P.S: "Queen II" tem o lado B mais sensacional de todos os tempos, só perde pro lado B do "Abbey Road"

P.S: E o "A Night At The Opera" talvez tenha sido o último grande disco do "classic rock".

Anônimo disse...

muito bom.

tbm curto muito o queen, e por tabela, o RT.
A Day At The Races, pra mim, um dos melhores momentos do rock nos '70.

Txotxa disse...

grande sylvio,
abração para vc!

f3rnando,
valeu pela lembrança.

cerqueira,
assino embaixo.

Anônimo disse...

e você nem se importa que ele use munhequeiras de tenista e camiseta regata?

Anônimo disse...

Fish!
Excelente escolha. A Night at The Opera é um dos discos que mais ouvi na vida. Aproveito pra elogiar a escolha de "Good Old Fashioned Lover Boy". Sensacional música, com uma dinâmica incrível. Adoro o piano dela!
Mas essa música "Mustapha" eu nunca tinha ouvido. Estranha pacas.
Abs!
Daniel Cariello

Txotxa disse...

Geórgia, hahahahaha!

Fish, falou e disse, campeão.

Anônimo disse...

amo rt ele é a coisa mais linda do mundo

Anônimo disse...

rt é lindo gostoso delicioso e tudo de bom.rt te amo.