quinta-feira, 19 de abril de 2007

Stewart Copeland

Primeiramente, queria me desculpar pela demora na postagem. Estou apanhando um pouco dos posts. Espero resolver isso até o final da semana.

Acredito que toda a geração dos anos 80 tenha sido fortemente influenciada por S. Copeland. E essa influência, na minha opinião, se refletiu muito pouco no aspecto musical.

Exemplo: quando alguém quer listar as influências de um baterista como João Barone (grande músico dos Paralamas), o primeiro nome que vem à cabeça é o de SC, correto? E essa associação não se dá por causa do som de JB, mas, sim, pela forma como ele posicionava (hj, nem tanto) os seus tambores, pelo uso de octabans, pela forma com que segurava (hj, nem tanto) a baqueta ou pelo fato dos PDS declararem abertamente o seu amor ao The Police.

Pq se formos analisar os aspectos rítmicos de Barone, vamos encontrar muito mais influência de Bonham (que ele já citou como um de seus ídolos, assim como Ringo Starr), do que de Copeland. Anote aí: batida carregada, com swing, tocando do meio para trás do andamento e agressividade contida. Ou seja, características opostas às de SC.

E essa conta serve também para outros bateristas que beberam nessa fonte, como Charles Gavin (Titãs), Taylor Hawkins (Foo Fighters), Adrian Young (No Doubt), entre outros. Quer dizer, são caras que, apesar de declararem a sua paixão por SC, não mantêm muitas das características essenciais (a meu ver) de sua música.
E isso não é, quero deixar claro, demérito algum para esses grandes bateristas. É apenas uma constatação de que a verdadeira arte de SC permanece ainda pouco estudada.

Considero S. Copeland quase como um extraterrestre em termos baterísticos. Ele surgiu na época do punk, onde, com exceção de Rats Scabies, baterista do Damned (*), ninguém tocava, de uma só vez, com força, rapidez e pressão. Só que no caso de RS, dá para ouvir a forte influência de Keith Moon (numa versão muuuuito mais vitaminada).
(*) valeu, André X.

Já o Copeland é um troço esquisitíssimo. É como se fosse um meteoro, sabe? Vc pode até medir a radiação da pedra, descobrir alguns componentes parecidos com os terrestres, mas, no geral, ninguém tem a menor idéia de como classificar ou reproduzir a sua estrutura.

E, para mim, é assim até hoje. Ninguém chegou perto. Nem mesmo ele, que, com essa volta do Police, não encara o Copeland de 20 anos atrás.

Bom, então quais seriam essas características tão diferentes e especiais assim?
Vou listá-las ao longo da seleção abaixo.
Vejam se as minhas idéias fazem algum sentido para vc...

NO TIME THIS TIME (Reggata de Blanc, 1979)
já começa com o pé na porta. note como a batida está sempre à frente do centro do compasso. ele empurra a banda o tempo inteiro, quase ao limite de correr com o andamento (no começo da carreira, ele adiantava e tomava esporro dos outros dois). outra marca de SC: os acentos na condução e o ximbau tocando todas as notas junto com o bumbo. quem é que consegue fazer isso numa velocidade dessas? e o detalhe: são duas baterias tocando ao mesmo tempo.

AWAY FROM HOME (Klark Kent: Kollected Works, 1980)
esse é o seu projeto solo dos anos 80, onde ele toca TUDO e canta. curiosamente, essa é uma das poucas vezes em que ele toca com certo swing. no geral as suas batidas são retas e vão direto na cara do freguês. outro detalhe nessa música é a clareza e precisão com que ele toca o ximbau. ximbau, aliás, que já foi elogiado por John Bonham. segundo Jason Bonham (filho), seu pai o levou para um dos shows do Police e pediu que prestasse atenção na forma que SC tocava a peça.

DRIVEN TO TEARS (Zenyatta Mondatta, 1980)
clássico do Police. para provar a sua falta de swing, ouça a versão do Sting, com Omar Hakim na bateria. SC toca reto, sem detalhes ou entonações. a sua dinâmica é sempre “do meio-dia para tarde”, e nunca vai do forte para o fraco. uma vez que a música começa, não tem arrego. outra marca: o rimshot tocado com toda a baqueta, sem descansar a mão na pela de caixa (como sempre fizeram os bateristas de reggae), o que deixa o som muito mais definido e potente.

TRUTH HITS EVERYBODY [Live] (Message in a Box: The Complete Recordings)
ouça o bumbo e os acentos do ximbau! aliás, essa é uma coisa interessante sobre a sua bateria: ele usava um ximbau de 13”, ao invés da tradicionais 14”, que dava chance para acentuar o ximbau à vontade sem atrapalhar o resto da batida.

HOLE IN MY LIFE (Outlandos d'Amour, 1978)
adoro essa música. é um dos pouco momentos onde ele entra na música de igual para igual, sem empurrar ninguém (pelo menos até o final :-). gosto muito do momento do bridge, quando ele vai para os pratos, acentuando nos lugares mais surpreendentes. as viradas no final também são fodas.

LOW LIFE (Single, 1981)
ótima música que foi ressuscitada por Sting no início de sua carreira solo. veja como a bateria vai misturando o clima de blues com a pegada do reggae ao longo da música (principalmente no final, depois do solo de sax, exatamente em 19’59” desse podcast). isso é coisa de quem tem a estrutura da batida totalmente sobre controle.

THE BED'S TOO BIG WITHOUT YOU (Reggata de Blanc, 1979)
que batida, que música! na minha opinião, é um standard do reggae. outra característica de SC: o uso inteligentíssimo dos splashs. note em 22’58” que o bumbo entre fora do tempo. isso é até um alento para o resto da população: SC erra e ainda deixa gravado.

MURDER BY NUMBERS (Synchronicity, 1983)
essa é uma aula de matemática. a batida começa no ¾ clássico. quando Sting entra, dá um certo nó. qual o tempo da voz? com os outros instrumentos, fica fácil. eu acho essa introdução muito bem sacada. é um outro exemplo de como ele dominava completamente a divisão do ritmo. o final é na mesma onda de “Low Life”. um exercício lega é contar a batida de blues em cima da primeira voz. muito doido... para mim, prova o quanto essa banda era especial.

MAN IN A SUITCASE (Zenyatta Mondatta, 1980)
clássico Copeland. tem de tudo: batida na frente, bumbo no contratempo, variações no ximbau, o som aberto e agudo dos toms, os splashs e a caixa mais seca e dura do planeta. excelente música, com uma linha de baixo tão foda quanto.

DARKNESS (Ghost In The Machine, 1981)
essa eu só prestei atenção por causa do Prata (meu amigo e colega dos anos de Maskavo Roots). tem que ouvir de fone para entender os efeitos do ximbau. além disso, a batida da bateria é tão discreta e precisa que parece programada. como é foi feita? com delay? não tenho a menor idéia... música futurística que deve ter sido composta pelo Sting de “Duna”.

NEXT TO YOU (Outlandos d'Amour, 1978)
1º música do 1º LP da banda. ao longo dos anos, ela foi triplicando de velocidade, mas o balanço (sem swing) continuou o mesmo. é muito legal a forma de usar os toms na batida, numa estrofe ainda, sem sobrecarregar a voz. essa música é um ótimo exemplo do que disse Sting no filme Bring On The Night: “No jazz, vc tem um tempo para esquentar durante a música; no rock vc tem que incendiar desde o primeiro compasso”.

Aproveito este post para iniciar uma série bem doente de analogias entre os bateristas desse blog e os animais selvagens.

Até o momento, são eles:

John Bonham – Urso Polar
Zigaboo Modeliste – Cavalo Alazão
Greg Errico – Puma
Charlie Watts – Bisão
Stewart Copeland – Leopardo

https://open.spotify.com/playlist/4Gbzr0btuZTvjoOFad3pjP?si=d488326a6a0740e4

abs
Txotxa

11 comentários:

THE MOVIE-GOER disse...

Mais uma aula, Seu Nascoxa...
Valeu, muito bom e bem escrito!

Bruno Ayres disse...

que trabalho primoroso, Txotxa!! Parabéns pela iniciativa!!

Um abração!

BT

rodroogs disse...

Só um 'pequeno' detalhe: vc sabia que 'Murder By Numbers' foi gravada no primeiro take, e ao vivo no estúdio?... incrível!
Mto bom! Abs...

Cerka

F3rnando disse...

Não sei se vc já viu a versão em DVD do "The Police - The Videos", vem com um "institucional" de extra, meia hora, apresentado pelo Jools Holland onde ele entrevista a banda na ilha de Montserrat, onde foi gravado boa parte do "Ghost In The Machine". Copeland mostra alguns efeitos (modernissimos, pra 1981, claro...) e lá pelo meio da conversa ele solta que difícil deve ser tocar guitarra, pq bateria "é muito fácil". Pra ele deve ser mesmo!

F3rnando disse...

Abusando um tiquinho mais, uma influência "parda" no Barone, tanto quanto o Copeland, seria o Everett Moreton(The Beat), que abusava do "one drop" tanto quanto o ex-(Atual? De novo? Voltaram, né...?) Police .

Txotxa disse...

f3rnando, com certeza para ele devia ser fácil. por isso, acho mesmo que ele não era muito normal :-).

quanto ao English Beat, os PDS até já ssumiram que pegaram emprestado dos ingleses a introdução de Óculos.

vc tem razão: o Barone possui muito mais influências, por isso é injusto enquadrá-lo (como fizeram durante anos) como uma cópia do SC.

abs

Txotxa disse...

jr e tigre, valeu pela presença!
"very diplomatic, very diplomatic"

Txotxa disse...

Cerka,

Não sabia dessa. Quando o caboblo é foda, não tem o que fazer, né?

Abs para vc.

Unknown disse...

Mais um excelente batera e uma excelente banda.
Vou acompanhar mais de perto esse seu blog e seu podcast, pois vc fala de bateras, e eu sou do mundo dos graves, e onde há um bom batera, geralmente há um ótimo baixista, como podemos comprovar com o Cream e The Police.
Falando e the police, eu acho essa banda muito loca, as vezes vejo que cada um da banda vai para um lado, um lance estranho mas bem feito.

Txotxa disse...

com certeza, Rick. o Sting é um excelente baixista, mesmo.
abs

Anônimo disse...

Parabéns pelo blog! Enfim, eu acho que o Copeland é o melhor na minha opinião. O cara era simples e teve um carreira no The Police muito curta, mesmo assim o cara trouxe inovações. Como por exemplo, ele popularizou uso de Splash, afinação (a caixa nem se fala), octobans (marca registrada), etc.

A respeito, os octobans era usados antes de que modo?

Até...